Ontem postei duas MÁS notícias no meu blog da UOL. No Paraná todos se sentem livres para BOTAR suas mãos nada leves nas Universidades Estaduais Públicas. Mãos vorazes, mãos que matam, mãos que mancham. Na gestão LERNER, considerado um governador erudito, culto (afinal é arquiteto), as Universidades quase foram vendidas via famoso Projeto 32/2002. Os empresários da cidade agitaram-se como moscas presas em teias de aranhas. Eufóricos ficaram. AGORA na segunda gestão do governador do PBMD, Reiquião, a repetição de faz: estamos presos a um conjunto de deputados que querem marcar as datas dos vestibulares das universidades públicas. MAIS: o governador PROIBIU AOS PROFESSORES a saída para outros estados em eventos, bancas...feudalismo? A lei pode-se chamar ODE AOS PROFESSORES! O governador ODEIA intelectual. Que bom! Sinal de que somos diferentes dele.
Segue comentário muito emocionante do professor Roberto Romano. Abri este novo BLOG para deixar o comentário completo, coisa que em meu Blog da UOl fica impossível. Doravante, passo a escrever aqui. MEDUSA seria outro nome para o BLOG.
Comentário do Professor Romano:
Paranaense, não raro sinto vergonha do Estado onde nasci. Na infância, Lupion. Minha mãe professora, escolas modernas, imitando o estilo de Brasilia, aulas sem retribuição de salário, sem materiais escolares, sem merenda. O alvo uniforme dos alunos, mal escondia o desânimo dos mestres, que além de tudo ensinavam à noite o beabá aos adultos analfabetos. Estradas poeirentas ou enlamaçadas, como símbolo da política. Depois, no poder do Estado uma série de nulidades ou de indivíduos sérios, mas sem mudar as regras medíocres do tacão, a marca registrada de toda oligarquia. O servilismo dos funcionários, sua prepotência contra os cidadãos. Andejei pelo norte paranaense de Londrina a Nova Esperança (antiga Capelinha). Deserto de gente, de liberdade, de cultura. Parte de minha familia voltou para São Paulo, em Marilia. Nas idas e vindas entre Marilia e Londrina, a estrada asfaltada paulista, a de terra e barro (mais valetas) no Paraná. A balsa que atravessava o rio, os ônibus (Viação Marilia-Iepê) que patinavam na lama, empurrados por todos os homens, mesmo os de 12 anos. O rosto marcado pela poeira, como triste máscara de um teatro sem nenhum sentido. Em toda porta de casa pobre ou mediana, um facão para limpar os pés que recolhiam barro das ruas, como se fossem um segundo pé, espécie de peso a prender cada um e todos ao atraso. Os facões limpavam os pés, mas não as almas. Um tanto antes, guerra de bandoleiros, a serviço da grilagem, doenças estranhas, falta do mínimo vital. E Londrina que crescia impiedosa, correndo em busca de ouro, verde ou de qualquer outra cor da desgraça travestida de esperança. E o Cine Ouro Verde, luxuoso como a elite, inútil como ela. Servilismo, servilismo. Na volta ao Paraná, décadas após...servilismo. Integrei a Comissão de Reconhecimento da Unicentro, Guarapuava. Um mes antes, fui convidado pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro para participar de Encontro nacional de universidades estaduais e municipais. Chegando ao saguão do encontro, dou uma gargalhada imensa. Em mesas adrede preparadas, jornais das universidades todas. Em cada um dos pasquins, a mesma seqüência. Na primeira página, o reitor concede medalha à vaca vencedora do concurso de pecuária, segunda página o reitor entrega medalhas ao time de basquete, na terceira página o reitor faz um discurso ao inaugurar a cantina do campus, terceira página....(não, leitor, não direi uma inverdade, mas com certeza a seqüência real seria que na terceira página o reitor sentado no troninho pensando da única maneira acessível a ele). Sempre o reitor, o Benefactor tiranete populista. Ao me dirigir à sala da palestra, sou informado que um dos participantes fora substituído por outro, que em princípio só falaria no dia seguinte. Normal. Mas também me disseram o motivo: o substituto era reitor de uma universidade do Nordeste, e seu nome (nome!) terminava com "inho". E ele queria "prestar contas" de sua administração uns dias antes de terminar o seu mandato. E o dia era aquele, fatídico. Ouvimos uma longa e tediosa exposição, molhada com lágrimas, sobre os grandes feitos da pessoa: instalou um serviço de saúde, asfaltou algumas ruas, deu uma festa junina, esteve no palácio do governador tantas vezes....No final da arenga, lágrimas e muitas palmas dos seus colegas reitores. Emocionante. Quase duas horas depois, começa o seminário. Ou melhor, foi tentado o começo do seminário. Segundo o que me foi pedido, levei uma palestra escrita sobre o conceito de democracia em Rousseau (o tema do congresso era a revisão constitucional). Enquanto tentava ler o meu texto, um grupo grande de reitores se reuniu nas portas da sala, rindo e contando piadas indecentes em voz altíssima. Lembrei o enterro recente de um tio: na beira do caixão, gente chorosa, um pouco mais longe, conversas animadas. E na porta, piadas pornográficas ouvidas alto e bom som por quem estava ao lado do ataúde...Enquanto eu buscava ler o texto, o barulho dos alegres reitores aumentava. Cortei metade do que tinha a dizer e encerrei. Acabou o seminário. Dirigi-me propositalmente ao grupo que estava na porta, rindo às bandeiras soltas. Fui informado de que todos eles eram...do Paraná. Fiquei tão furioso que cancelei duas outras apresentações, a serem feitas no dia seguinte. Subi ao lugar onde guardei a bagagem e desci para tomar o táxi. No elevador, encontro dois dos reitores gargalhantes. Um deles, com arrogância e grosseria disse na lata :"sabe, professor, não me interessa o bla-bla-bla filosófico" (comentário Marta Bellini: creio que sei quem é esta antalógica). Retruquei que o tema da revisão constitucional exigia, das pessoas honestas intelectualmente, análises da gênese do conceito de cidadania, república, etc. Mais risos e caçoadas.Até aqui, a parte menos grave. Passo à que representa a espinha paranaense (SALVO, SALVO, SALVO AS EXCEÇÕES, RARÍSSIMAS). Fui nomeado, como disse, para integrar a Comissão de Reconhecimento da Unicentro um mês depois das cenas deprimentes no Rio de Janeiro. Tomo o avião da TAM e desço no aeroporto onde sou recepcionado pelo Professor Ubaldo Puppi, presidente do Conselho Estadual de Educação e, just for the record, meu padrinho de crisma. Conhecia o Dr. Puppi desde a minha adolescência em Marilia. Dele recebi as primeiras lições de filosofia. Ele, que fora secretário em Paris de Jacques Maritain, foi perseguido em 1964, precisando comer o diabo que o pão amassou nas mãos da direita mariliense. Tratava-se de uma inteligência superior em alma boníssima. Passada a emoção de um re-encontro, após anos de distância, quem vejo ao meu lado, vermelho, confuso, não sabendo onde enfiar os pés e as mãos? Um dos reitores gargalhantes e arrogantes. "Desculpe, professor, eu não sabia...". Frase terrível. Ele não sabia que, um mes depois da sua alegre participação em seminário que deveria ser sério, o suposto palhaço poderia julgar sua universidade, dando-lhe permissão ou negando a sua continuidade. Ele não sabia que o idiota poderia ser...poderoso, pelo menos momentâneamente. Esta parte causou-me maior dor de estomago, para não dizer ansia de vômito, do que a das piadas. Paraná....Enfim, cara Marta Bellini, entendo a lógica dos deputados e do governador paranaense: eles mandam, tem o poder. E só existe para eles quem for poderoso, explicitamente poderoso. O resto é escravo. E, tristeza, eles têm razão! Paraná....
Receba, cara professora, com os seus colegas que se levantam contra a tirania habitual paranaense, o meu abraço.
Um comentário:
Parabéns pelo novo look. Ficou bacana.
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