Enviado pelo Acir Vidal....
Grata, Acir!
A CRASE E OS POLÍTICOS MALUCOS
José Augusto Carvalho
A crase é antes de tudo a fusão de duas vogais iguais. Vale dizer: quando ocorre a sequência de duas vogais iguais, pertencentes a palavras diferentes ou no interior da mesma palavra, pode ocorrer a crase. Por exemplo: o pretérito imperfeito do verbo partir é “partia”. Ocorreu aí a fusão do i, vogal temática, com a desinência modo temporal –ia: parti + ia = partia. Quando alguém diz uma palavra terminada em vogal átona seguida de outra palavra começada com a mesma vogal átona, ocorre crase. Há crase do a em “camisa azul”; do e, em “leite estragado”; do o, em “Belo Horizonte”...
Do ponto de vista histórico, há palavras que sofreram crase na evolução do latim vulgar para o português. Assim, houve crase na passagem de coor (de colore-) para cor (cf. colorir, em que os dois “os” aparecem separados); ou de pee (de pede-) para pé (cf. pedestre).
Normalmente, contudo, quando se fala em crase, a referência é à fusão de dois “as”, em que o primeiro “a” é sempre a preposição; o segundo pode ser o artigo definido feminino “a”, o demonstrativo “a” (equivalente a “aquela”) ou a vogal viúva dos pronomes demonstrativos aquele/aquela/aquilo. A crase do “a” não é apenas um problema gráfico, representado pela presença do acento grave sobre uma vogal central baixa. Mais que isso, a crase é um problema de fonética sintática e de regência verbal e nominal. E nem sempre o acento grave sobre o “a” indica a existência de crase. Quando dizemos “vendo livros à professora”, temos a fusão de dois “as”: o “a” da preposição com o “a” do artigo feminino, porque, no masculino, diríamos “vendo livros ao professor” (preposição mais artigo masculino). Mas, quando digo “vendas à vista”, a preposição simples é que é acentuada, sem que haja aí duas vogais iguais fundidas numa só. O acento é apenas uma convenção, segundo a qual se deve acentuar o “a” das locuções femininas. O masculino equivalente não tem artigo: “vendas a prazo”, o que significa que só existe um “a”, preposição, e não dois, na expressão “vendas à vista”. Quando escrevemos “sair à noite”, acentuamos apenas a preposição (não há crase aí, mas apenas um “a” acentuado), pois podemos dizer “sair de noite”, em que também usamos apenas a preposição.
Tudo isso vem a propósito de uma notícia divulgada pelos jornais no dia 04-01-09: o deputado João Hermann Neto (PDT-SP) é autor de um projeto de lei que pretende eliminar o uso da crase na língua portuguesa. O deputado justifica-se, dizendo que a crase só serve para humilhar os falantes e complicar a língua portuguesa. Se entendesse do assunto-objeto de seu projeto de lei, o deputado saberia que não se pode eliminar por vontade própria nenhum fenômeno sintático de nenhuma língua. O que esse político ignorante talvez esteja pretendendo fazer é eliminar o acento grave indicativo de crase, não a crase. A justificativa dele também merece reparos. Se a crase humilha alguém, há de ser o mau falante da língua ou o político que se acha dono da língua ou desconhece que a sintaxe está acima da vontade pessoal dos falantes.
E já que estamos falando de ignorância de políticos, um adendo: os jornais do dia 04-01-09 noticiam que o vereador Aloísio Módulo de Almeida (PMN), de Marechal Floriano, por ter problemas de rins, resolveu criar um projeto de lei que proíbe os munícipes de consumir carambola, fruta que pode prejudicar pacientes com insuficiência renal. A idéia “humanitária” desse edil é a de que ele não deseja que outras pessoas tenham o problema de rins que ele enfrenta. Pela miopia intelectual desse vereador, se ele fosse diabético proibiria o consumo de açúcar e de doces do seu município? Se tivesse cirrose hepática, proibiria o uso de bebidas alcoólicas? Se tivesse enfisema pulmonar, proibiria o fumo? Insensatez maior foi a do prefeito, que sancionou essa lei absurda!
Como diria Francelino Pereira, que país é este?
A CRASE E OS POLÍTICOS MALUCOS
José Augusto Carvalho
A crase é antes de tudo a fusão de duas vogais iguais. Vale dizer: quando ocorre a sequência de duas vogais iguais, pertencentes a palavras diferentes ou no interior da mesma palavra, pode ocorrer a crase. Por exemplo: o pretérito imperfeito do verbo partir é “partia”. Ocorreu aí a fusão do i, vogal temática, com a desinência modo temporal –ia: parti + ia = partia. Quando alguém diz uma palavra terminada em vogal átona seguida de outra palavra começada com a mesma vogal átona, ocorre crase. Há crase do a em “camisa azul”; do e, em “leite estragado”; do o, em “Belo Horizonte”...
Do ponto de vista histórico, há palavras que sofreram crase na evolução do latim vulgar para o português. Assim, houve crase na passagem de coor (de colore-) para cor (cf. colorir, em que os dois “os” aparecem separados); ou de pee (de pede-) para pé (cf. pedestre).
Normalmente, contudo, quando se fala em crase, a referência é à fusão de dois “as”, em que o primeiro “a” é sempre a preposição; o segundo pode ser o artigo definido feminino “a”, o demonstrativo “a” (equivalente a “aquela”) ou a vogal viúva dos pronomes demonstrativos aquele/aquela/aquilo. A crase do “a” não é apenas um problema gráfico, representado pela presença do acento grave sobre uma vogal central baixa. Mais que isso, a crase é um problema de fonética sintática e de regência verbal e nominal. E nem sempre o acento grave sobre o “a” indica a existência de crase. Quando dizemos “vendo livros à professora”, temos a fusão de dois “as”: o “a” da preposição com o “a” do artigo feminino, porque, no masculino, diríamos “vendo livros ao professor” (preposição mais artigo masculino). Mas, quando digo “vendas à vista”, a preposição simples é que é acentuada, sem que haja aí duas vogais iguais fundidas numa só. O acento é apenas uma convenção, segundo a qual se deve acentuar o “a” das locuções femininas. O masculino equivalente não tem artigo: “vendas a prazo”, o que significa que só existe um “a”, preposição, e não dois, na expressão “vendas à vista”. Quando escrevemos “sair à noite”, acentuamos apenas a preposição (não há crase aí, mas apenas um “a” acentuado), pois podemos dizer “sair de noite”, em que também usamos apenas a preposição.
Tudo isso vem a propósito de uma notícia divulgada pelos jornais no dia 04-01-09: o deputado João Hermann Neto (PDT-SP) é autor de um projeto de lei que pretende eliminar o uso da crase na língua portuguesa. O deputado justifica-se, dizendo que a crase só serve para humilhar os falantes e complicar a língua portuguesa. Se entendesse do assunto-objeto de seu projeto de lei, o deputado saberia que não se pode eliminar por vontade própria nenhum fenômeno sintático de nenhuma língua. O que esse político ignorante talvez esteja pretendendo fazer é eliminar o acento grave indicativo de crase, não a crase. A justificativa dele também merece reparos. Se a crase humilha alguém, há de ser o mau falante da língua ou o político que se acha dono da língua ou desconhece que a sintaxe está acima da vontade pessoal dos falantes.
E já que estamos falando de ignorância de políticos, um adendo: os jornais do dia 04-01-09 noticiam que o vereador Aloísio Módulo de Almeida (PMN), de Marechal Floriano, por ter problemas de rins, resolveu criar um projeto de lei que proíbe os munícipes de consumir carambola, fruta que pode prejudicar pacientes com insuficiência renal. A idéia “humanitária” desse edil é a de que ele não deseja que outras pessoas tenham o problema de rins que ele enfrenta. Pela miopia intelectual desse vereador, se ele fosse diabético proibiria o consumo de açúcar e de doces do seu município? Se tivesse cirrose hepática, proibiria o uso de bebidas alcoólicas? Se tivesse enfisema pulmonar, proibiria o fumo? Insensatez maior foi a do prefeito, que sancionou essa lei absurda!
Como diria Francelino Pereira, que país é este?
Um comentário:
Querida Marta.
Agradeço por divulgar também o trabalho desse seu grande colega.
Bjs
Acir Vidal, editor do
www.contraovento.blogger.com.br
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