Do Josias de Souza
19/04/2009
Na moita, Câmara libera obras sem licença ambiental
Em votação realizada na última quarta-feira, os deputados inseriram um artigo novo na medida provisória do Fundo Soberano.
A novidade passou como um detalhe, em meio a um debate que tinha como miolo a emissão de títulos públicos para despejar no Fundo Soberano R$ 14,2 bilhões.
Deve-se o “detalhe” ao relator da MP, José Guimarães (PT-CE). Autorizou a realização de obras rodoviárias sem a emissão de licença ambiental, uma exigência legal.
O texto clandestino foi injetado na peça original na altura do artigo 5º. Concede ao DNIT, órgão que cuida das rodovias, poderes inauditos.
Reza o artigo que o departamento do ministério dos Transportes fica dispensado de buscar o necessário licenciamento ambiental em três tipos de obras:
“Pavimentação”, “melhoramentos” e “adequação” de estradas. E, eis o pulo do gato, também nas obras de “ampliação da capacidade” de rodovias.
Significa dizer que o governo pode, quando bem entender, transformar uma estradinha de mão dupla numa grandiosa autopista sem dar atenção aos órgãos ambientais.
Ainda que as estradas “ampliadas” cortem pedaços da Mata Atlântica ou da selva Amazônica.
Manteve-se a exigência de licença ambiental apenas para a abertura de estradas novas. Ainda assim, com outro “detalhe”.
As autoridades ambientais terão 60 dias para se manifestar. Vencido esse prazo, as obras serão iniciadas. Mesmo que envolvam atentados ao meio ambiente.
O ministro Carlos Minc (Meio Ambiente) tentou evitar o descalabro. Em contato com deputados governistas, rogou que o inusitado artigo 5º fosse suprimido da MP.
Não lhe deram ouvidos. O contrabando empurrado para dentro da MP interessava à Casa Civil da ministra Dilma Rousseff, mais interessada em acelerar obras.
O PV, frágil representante da causa verde no Congresso, apresentou uma emenda para tentar derrubar o inaceitável. Foi esmagado pela maioria governista.
O PSDB voltou à carga. O líder tucano José Aníbal (SP) propôs que fosse suprimida da MP pelo menos a expressão “ampliação da capacidade” das rodovias.
Nessa hipótese, a licença ambiental seria dispensada só para obras de recapeamento de de estradas já existentes. O trator governista patrolou, de novo, a emenda tucana.
A muamba ambiental do Fundo Soberano está longe de ser um caso isolado. Na mesma quarta-feira, a Câmara produziu uma segunda velhacaria.
O relator João Leão (PP-BA) injetou numa MP que versava sobre Imposto de Renda um artigo que autoriza a União a repassar verbas para municípios inadimplentes.
Uma vez assinado o convênio, os repasses tornam-se obrigatórios. Mesmo que o prefeito atente contra a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Crítico do excesso de medidas provisórias, o Congresso vem se servindo delas para converter absurdos em lei. Fundiona assim:
1. O presidente da República manda ao Legislativo uma MP tratando de tema específico;
2. A pretexto de “aperfeiçoar” a MP, os parlamentares a transformam num monstrengo chamado “projeto de conversão”;
3. Nesse projeto, são inseridos os “contrabandos”, que nada têm a ver com o propósito inicial da medida provisória;
4. Na hora de votar, os repórteres destacados para acompanhar a usina do plenário dão mais atenção ao miolo da picanha. E frangam a gordura.
5. A maioria dos congressistas adota o comparmento de manada. Tangida pelos líderes, as bancadas entram cegamente nas porteiras que lhes indicam.
As últimas MPs aprovadas na Câmara seguiram, com os contrabandos de cambulhada, para o Senado. Salvas as muambas, o tucano Aníbal cogita recorrer ao Judiciário.
Por ora, consolida-se a impressão de que, no Brasil, a Casa de leis, na hora de legislar, guia-se por uma lei maior: a Lei das Selvas, que tudo admite.
19/04/2009
Na moita, Câmara libera obras sem licença ambiental
Em votação realizada na última quarta-feira, os deputados inseriram um artigo novo na medida provisória do Fundo Soberano.
A novidade passou como um detalhe, em meio a um debate que tinha como miolo a emissão de títulos públicos para despejar no Fundo Soberano R$ 14,2 bilhões.
Deve-se o “detalhe” ao relator da MP, José Guimarães (PT-CE). Autorizou a realização de obras rodoviárias sem a emissão de licença ambiental, uma exigência legal.
O texto clandestino foi injetado na peça original na altura do artigo 5º. Concede ao DNIT, órgão que cuida das rodovias, poderes inauditos.
Reza o artigo que o departamento do ministério dos Transportes fica dispensado de buscar o necessário licenciamento ambiental em três tipos de obras:
“Pavimentação”, “melhoramentos” e “adequação” de estradas. E, eis o pulo do gato, também nas obras de “ampliação da capacidade” de rodovias.
Significa dizer que o governo pode, quando bem entender, transformar uma estradinha de mão dupla numa grandiosa autopista sem dar atenção aos órgãos ambientais.
Ainda que as estradas “ampliadas” cortem pedaços da Mata Atlântica ou da selva Amazônica.
Manteve-se a exigência de licença ambiental apenas para a abertura de estradas novas. Ainda assim, com outro “detalhe”.
As autoridades ambientais terão 60 dias para se manifestar. Vencido esse prazo, as obras serão iniciadas. Mesmo que envolvam atentados ao meio ambiente.
O ministro Carlos Minc (Meio Ambiente) tentou evitar o descalabro. Em contato com deputados governistas, rogou que o inusitado artigo 5º fosse suprimido da MP.
Não lhe deram ouvidos. O contrabando empurrado para dentro da MP interessava à Casa Civil da ministra Dilma Rousseff, mais interessada em acelerar obras.
O PV, frágil representante da causa verde no Congresso, apresentou uma emenda para tentar derrubar o inaceitável. Foi esmagado pela maioria governista.
O PSDB voltou à carga. O líder tucano José Aníbal (SP) propôs que fosse suprimida da MP pelo menos a expressão “ampliação da capacidade” das rodovias.
Nessa hipótese, a licença ambiental seria dispensada só para obras de recapeamento de de estradas já existentes. O trator governista patrolou, de novo, a emenda tucana.
A muamba ambiental do Fundo Soberano está longe de ser um caso isolado. Na mesma quarta-feira, a Câmara produziu uma segunda velhacaria.
O relator João Leão (PP-BA) injetou numa MP que versava sobre Imposto de Renda um artigo que autoriza a União a repassar verbas para municípios inadimplentes.
Uma vez assinado o convênio, os repasses tornam-se obrigatórios. Mesmo que o prefeito atente contra a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Crítico do excesso de medidas provisórias, o Congresso vem se servindo delas para converter absurdos em lei. Fundiona assim:
1. O presidente da República manda ao Legislativo uma MP tratando de tema específico;
2. A pretexto de “aperfeiçoar” a MP, os parlamentares a transformam num monstrengo chamado “projeto de conversão”;
3. Nesse projeto, são inseridos os “contrabandos”, que nada têm a ver com o propósito inicial da medida provisória;
4. Na hora de votar, os repórteres destacados para acompanhar a usina do plenário dão mais atenção ao miolo da picanha. E frangam a gordura.
5. A maioria dos congressistas adota o comparmento de manada. Tangida pelos líderes, as bancadas entram cegamente nas porteiras que lhes indicam.
As últimas MPs aprovadas na Câmara seguiram, com os contrabandos de cambulhada, para o Senado. Salvas as muambas, o tucano Aníbal cogita recorrer ao Judiciário.
Por ora, consolida-se a impressão de que, no Brasil, a Casa de leis, na hora de legislar, guia-se por uma lei maior: a Lei das Selvas, que tudo admite.
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