Foto: José Cruz/Abr O Presidente do Senado José Sarney e da Câmara Michel Temer, numa sessão conjunta das duas casas, festivamente comemoram a assinatura da PEC dos Vereadores
Do Blog do TOINHO da PASSIRA
Mais 8 mil vereadores vão salvar o Brasil?
Diego Escosteguy Fonte: Veja
No Brasil, toda cidade tem pelo menos uma praça, uma igreja, um bar – e uma câmara de vereadores. Nenhum político é tão presente na vida do brasileiro quanto o vereador: existem hoje quase 52 000 representantes nas câmaras municipais. O vereador é tão tradicional na política brasileira que remonta ao longínquo ano de 1532, quando o primeiro deles foi eleito na vila de São Vicente. Cabe a ele encaminhar demandas da população ao governo local, cobrar resultados dos prefeitos e fazer leis municipais. No papel, uma boa ideia. Ficou na intenção. O projeto degenerou numa pálida e triste sombra do que poderia ser. Com o nascimento da República, em 1889, e a consequente concentração de poderes nas mãos de presidentes e governadores, os vereadores entraram num longo crepúsculo de irrelevância. Os gastos com as câmaras municipais passaram a crescer na mesma proporção dos escândalos que delas surgiam. Aos poucos, o posto de vereador perdeu sua nobre função democrática, transfigurando-se num mero carguinho, um meio de atender aos interesses políticos e, não raro, financeiros de seus ocupantes. A Constituição de 1988 consagrou esse duvidoso modelo, que hoje nos custa 6 bilhões de reais por ano – e, na semana passada, os congressistas conseguiram piorá-lo.
Sem resistências de nenhum partido, os parlamentares aprovaram uma emenda à Constituição que aumenta o número de vereadores em cerca de 8.000. Os deputados e senadores ainda deixaram uma sorrateira brecha na emenda, pela qual os atuais suplentes podem ocupar imediatamente essas vagas. Esse é o motivo para a efusiva comemoração estampada na foto acima. A reação ao casuísmo, no entanto, não tardou. O presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Carlos Ayres Britto, referindo-se à possibilidade de posse desse pequeno exército, lembrou que a corte já havia estabelecido o dia 30 de junho deste ano como data-limite para qualquer alteração no cálculo do número de vereadores. Em outras palavras, Ayres Britto deixou claro que o tribunal não permitirá a farra: "A emenda atual chegou tarde para entrar em vigor na corrente legislatura". As novas regras, portanto, só valem a partir das eleições de 2012 – se as cortes superiores não as derrubarem até lá, o que é provável. A decisão dos parlamentares configura um retrocesso de cinco anos. Antes das eleições de 2004, o TSE havia cortado mais de 8 000 vagas, por entender que os municípios estavam extrapolando o limite constitucional de número de vereadores. Desde então, os congressistas tentavam aprovar a emenda que multiplicaria novamente os assentos municipais. Não há razões republicanas que justifiquem as novas vagas. Eis o que escreveu na sua proposta o deputado Arnaldo Faria de Sá, do PTB de São Paulo, relator da emenda: "As câmaras de vereadores é (sic) a escola dos políticos estaduais e nacionais. O vereador procura... trazer melhorias àqueles que o rodeiam, bem como ainda (sic), a melhoria num todo". (Registre-se que a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovou esse texto.) Não é preciso ter ido à escola para perceber que não foram os argumentos bem construídos do deputado Arnaldo Faria de Sá que conquistaram os parlamentares. Tanto empenho para aprovar a emenda explica-se pela importância eleitoral dos vereadores, especialmente nas pequenas cidades do país. Nesses lugares, o apoio político dos vereadores é essencial para assegurar votos aos candidatos à Presidência, ao governo estadual, ao Senado, à Câmara, a prefeito...
Sob uma perspectiva puramente política, portanto, os deputados e senadores ganharam 8.000 cabos eleitorais – pagos com o nosso dinheiro. Diz o cientista político Octaciano Nogueira, da Universidade de Brasília: "Para que tantos vereadores? Não há dúvida de que se trata de um número exagerado. Eles deveriam ser meros síndicos das comunidades".
Sem resistências de nenhum partido, os parlamentares aprovaram uma emenda à Constituição que aumenta o número de vereadores em cerca de 8.000. Os deputados e senadores ainda deixaram uma sorrateira brecha na emenda, pela qual os atuais suplentes podem ocupar imediatamente essas vagas. Esse é o motivo para a efusiva comemoração estampada na foto acima. A reação ao casuísmo, no entanto, não tardou. O presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Carlos Ayres Britto, referindo-se à possibilidade de posse desse pequeno exército, lembrou que a corte já havia estabelecido o dia 30 de junho deste ano como data-limite para qualquer alteração no cálculo do número de vereadores. Em outras palavras, Ayres Britto deixou claro que o tribunal não permitirá a farra: "A emenda atual chegou tarde para entrar em vigor na corrente legislatura". As novas regras, portanto, só valem a partir das eleições de 2012 – se as cortes superiores não as derrubarem até lá, o que é provável. A decisão dos parlamentares configura um retrocesso de cinco anos. Antes das eleições de 2004, o TSE havia cortado mais de 8 000 vagas, por entender que os municípios estavam extrapolando o limite constitucional de número de vereadores. Desde então, os congressistas tentavam aprovar a emenda que multiplicaria novamente os assentos municipais. Não há razões republicanas que justifiquem as novas vagas. Eis o que escreveu na sua proposta o deputado Arnaldo Faria de Sá, do PTB de São Paulo, relator da emenda: "As câmaras de vereadores é (sic) a escola dos políticos estaduais e nacionais. O vereador procura... trazer melhorias àqueles que o rodeiam, bem como ainda (sic), a melhoria num todo". (Registre-se que a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovou esse texto.) Não é preciso ter ido à escola para perceber que não foram os argumentos bem construídos do deputado Arnaldo Faria de Sá que conquistaram os parlamentares. Tanto empenho para aprovar a emenda explica-se pela importância eleitoral dos vereadores, especialmente nas pequenas cidades do país. Nesses lugares, o apoio político dos vereadores é essencial para assegurar votos aos candidatos à Presidência, ao governo estadual, ao Senado, à Câmara, a prefeito...
Sob uma perspectiva puramente política, portanto, os deputados e senadores ganharam 8.000 cabos eleitorais – pagos com o nosso dinheiro. Diz o cientista político Octaciano Nogueira, da Universidade de Brasília: "Para que tantos vereadores? Não há dúvida de que se trata de um número exagerado. Eles deveriam ser meros síndicos das comunidades".
A figura desses síndicos existe na maioria das democracias ocidentais, como Estados Unidos, França e Inglaterra. É uma tradição que remonta aos edis da Roma antiga. Nesses países, contudo, considera-se o cargo um serviço público, voltado para o bem da comunidade – e que, como tal, prescinde de remuneração. Nesse quesito, o Brasil inovou, e hoje paga salários aos vereadores de todas as cidades. A figura do vereador, apesar de aperfeiçoada aqui, é uma herança portuguesa, que persiste nos países colonizados pela antiga potência ultramarina. Até a independência do Brasil, em 1822, os vereadores detinham a primazia da ação política no país. Para ser vereador, contudo, era preciso ter nacionalidade portuguesa – uma maneira que os colonizadores encontraram para controlar as atividades políticas do Brasil. Cabia a esses homens cuidar dos interesses da coroa no país. Hoje, tantos anos depois, a emenda aprovada pela Câmara demonstra que o patrão realmente mudou. Deveria ser o povo – mas são eles mesmos, os políticos.
*“Mais 8 000 vereadores nas câmaras” é o título original do texto na Revista Veja
**Acrescentamos fotos e legendas
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