A feminista, o lobo, a amante e o lambari por Barbara Gancia, Folha de São Paulo, 1/6/07
Como pode uma feminista aplaudir o tratamento dispensado pelo presidente do Senado à amante e à filha?
PARA MIM , o personagem da semana não foi um empreiteiro preso, um juiz nem um policial federal. Foi Ideli Salvatti.Se você, meu nobre leitor, não teve a infelicidade de ver a senadora (PT-SC) na televisão externando sua compaixão por Renan Calheiros, sorte sua. A mim, a defesa que Salvatti fez do colega virou o estômago de tal forma, que só de lembrar já saio correndo atrás do sal de frutas. Explico: que políticos machistas tenham aplaudido o depoimento de Renan Calheiros a gente pode até, se não aprovar, compreender. Mas que uma mulher que se diz feminista considere louvável o tratamento dispensado pelo senador à amante e à filha em seu depoimento, é de ir queimar sutiã na av. Paulista.Em nenhum momento durante sua deposição, Renan demonstrou afeto pela filha que teve fora do casamento. Em nenhum momento, depois de pedir desculpas à mulher, à família e a seus pares, ele pediu perdão à Mônica Veloso, a jornalista que é a mãe da menina. Não vi o depoimento do senador na íntegra, mas até agora não sei o nome da filha que Calheiros teve fora do casamento. Será que a menina não tem nome ou, para ele, é tão insignificante que se resume apenas a um problema de mesada?É certo que Brasília é um dos lugares do mundo onde mais se comete infidelidade e adultério. Não é preciso conhecer a turminha do barulho do ex-ministro Antonio Palocci, para saber que a capital federal é uma festa para políticos casados, que pulam a cerca durante a semana quando estão na capital federal a trabalho, depois voltam para os braços das respectivas nos fins de semana. O deputado Antonio Carlos Magalhães fez piada nesta semana, dizendo que não poderia falar nada sobre Mônica Veloso, porque ela já foi sua parente, uma alusão ao suposto caso que a jornalista teve com seu filho, Luís Eduardo, morto em 1998. Claro, não é mesmo? A troca de favores entre Calheiros e seu amigo empreiteiro passa convenientemente para segundo plano, todos se abraçam e trocam tapinhas nas costas e a maldita da amante que leve a culpa e seja motivo de escárnio. Outro dia, comentava com uma amiga sobre uma festa de Natal onde todo ano nos encontramos há mais de duas décadas. Nos primeiros anos, éramos todos solteiros. Depois, cada um foi casando e trazendo a cara-metade para a festa. Nos últimos quatro ou cinco anos, o cenário mudou de novo de forma radical. Agora, a maioria das ex-mulheres vai à festa desacompanhada e os homens vão com suas novas mulheres, bem mais moças do que eles. São todos homens poderosos, tal qual Renan Calheiros, e todos na mesma faixa etária do senador. Para a boa fortuna das mulheres, porém, no nosso meio não há uma Ideli Salvatti que se solidarize com os machões. Mas vai saber. No PT pode de tudo. Até feminista machista eles agora conseguiram inventar.Para terminar, uma perguntinha: se quase metade do Congresso (211 de 513 deputados) e quase metade do Senado (35 de 81 senadores) recebeu doações de empreiteiras, será o lambari Gautama o único a manter relações promíscuas com o poder?
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