TUCA PUC 1977
EU QUASE QUE NADA SEI. MAS DESCONFIO DE MUITA COISA. GUIMARÃES ROSA.

sábado, 21 de agosto de 2010

Manoel Alegre....em um mundo triste


Da Joana Lopes, Lisboa, o belo texto: Manoel Alegre e o direito à resistência


O jornal «i» publicou ontem mais um texto sobre o passado militar de Manuel Alegre. Não me interessa a «acusação», mil vezes repetida, comentada e desmentida, quanto a uma hipotética condição de desertor que não foi (e se tivesse sido?!...), mas sim afirmações absolutamente extraordinárias, que ainda não vi comentadas, de um almirante, de seu nome Vieira Matias, que foi chefe do Estado-Maior da Armada, de 1997 a 2002.


Vieira Matias diz saber que Manuel Alegre não foi desertor, por ter sido mobilizado para Angola e ali ter permanecido até passar à disponibilidade (em Dezembro de 1963, com ordem de regresso, depois de preso pela PIDE e com residência fixa em Coimbra), mas que «isso é o que menos importa». Porque grave foi a sua acção na Rádio Voz da Liberdade, em Argel, que «criava danos psicológicos nas nossas tropas e incentivava o inimigo a combater mais violentamente». A guerra colonial era injusta para Manuel Alegre? «Poderia ser a opinião dele, mas não lhe dava o direito de criar condições para causar mais baixas nos seus compatriotas.»


Ou seja: em 2010, alguém, que exerceu um cargo da maior responsabilidade nas Forças Armadas, diz impunemente alarvidades destas e ninguém reage. Trinta e seis anos depois do 25 de Abril, põe-se em causa um candidato à presidência da República porque ele foi um resistente activo, não só mas também contra a guerra colonial, num exílio em Argel (que, garanto-vos eu, esteve longe de ser de luxo quando não foi mesmo de perigo), naquele que foi um instrumento da oposição portuguesa, absolutamente único: a Rádio Voz da Liberdade. Quantas notícias sobre o que se passava nas várias frentes de guerra não nos chegavam apenas através desse som que tentávamos, tantas vezes em vão, captar pela calada da noite, em rádios sempre mais ou menos roufenhos? Vem agora pôr-se em causa o «direito» à denúncia do que se passava em África? O «direito» à luta contra a ditadura?


O currículo do Vieira Matias não diz «onde é que ele estava no 25 de Abril». Não sei quem o nomeou para chefe do Estado-Maior da Armada. Mas, entre 1997 e 2002, o presidente desta República era Jorge Sampaio e o primeiro-ministro chamava-se António Guterres. A brandura dos nossos costumes e as cedências nalgumas nomeações têm um sabor amargo, mesmo alguns anos mais tarde. E, por vezes, pagam-se caras.


P.S. 1 – Dizem-me entretanto que Vieira Matias pertence actualmente ao Conselho das Antigas Ordens Militares, «nomeado por alvará do Presidente da República».


P.S. 2 - Justiça seja feita: acabo de saber que Vieira Matias «foi corrido» por Jorge Sampaio. (30/7, 10:52)
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Nambuangongo Meu Amor

Em Nambuangongo tu não viste nada
não viste nada nesse dia longo longo
a cabeça cortada
e a flor bombardeada
não tu não viste nada em Nambuangongo

Falavas de Hiroxima tu que nunca viste
em cada homem um morto que não morre
.
Sim nós sabemos Hiroxima é triste
mas ouve em Nambuangongo existe
em cada homem um rio que não corre.

Em Nambuangongo o tempo cabe num minuto
em Nambuangongo a gente lembra a gente esquece
em Nambuangongo olhei a morte e fiquei nu. Tu
não sabes mas eu digo-te: dói muito.
Em Nambuangongo há gente que apodrece.

Em Nambuangongo a gente pensa que não volta
cada carta é um adeus em cada carta se morre
cada carta é um silêncio e uma revolta.
Em Lisboa na mesma isto é a vida corre.
E em Nambuangongo a gente pensa que não volta.

É justo que me fales de Hiroxima.
Porém tu nada sabes deste tempo longo longo
tempo exactamente em cima
do nosso tempo. Ai tempo onde a palavra vida rima
com a palavra morte em Nambuangongo
.
*************************
Ser ou não ser

Qualquer coisa está podre no Reino da Dinamarca.
Se os novos partem e ficam só os velhos
e se do sangue as mãos trazem a marca
se os fantasmas regressam e há homens de joelhos

qualquer coisa está podre no Reino da Dinamarca.

Apodreceu o sol dentro de nós
apodreceu o vento em nossos braços.
Porque há sombras na sombra dos teus passos
há silêncios de morte em cada voz.

Ofélia-Pátria jaz branca de amor.
Entre salgueiros passa flutuando.
E anda Hamlet em nós por ela perguntando
entre ser e não ser firmeza indecisão.

Até quando? Até quando?

Já de esperar se desespera. E o tempo foge
e mais do que a esperança leva o puro ardor.

Porque um só tempo é o nosso. E o tempo é hoje.
Ah se não ser é submissão ser é revolta.
Se a Dinamarca é para nós uma prisão
e Elsenor se tornou a capital da dor
ser é roubar à dor as próprias armas
e com elas vencer estes fantasmas
que andam à solta em Elsenor.

Manuel Alegre

Um comentário:

Joaquim Coelho disse...

Só para lembrar que Manuel Alegre, mais do que traidor aos camaradas de armas é um cobarde que abandonou os "seus" comandados em situação crítica e perigosa aquando da tentativa de revolta militar em Angola - 1962.
Esse episódio está abafado pelas chefias militares do tempo do Governador de Angola General Venâncio Deslandes.
Para bem dos antigos combatentes, acabe-se com a vergonhosa tentativa de limpar a folha de serviço do Manuel Alegre.

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