Roberto Romano no Correio Popular de Campinas
Os assessores de imprensa da Unicamp conhecem minha boa vontade. Sempre que surge um pedido de entrevista, ajuda na busca de fontes teóricas e históricas, eles indicam meu nome para os colegas empregados em jornais, rádios etc. Procuro ser o mais afável possível porque é obrigação de quem pesquisa e reflete sobre os costumes (políticos, religiosos, sociais), prestar contas ao público do que se faz na universidade. Adquiri amigos na imprensa e sou grato pelas ocasiões de aprender com profissionais da mídia.
Mas logo notei que, se no meio jornalístico (como em todo outro) existem pessoas educadas e respeitosas, nele também grassam os que os gregos apelidavam de anaísthetos (casca grossa) desatentos aos problemas alheios, ocupados apenas em sua carreira e tarefas. A grosseria começa com estudantes de jornalismo. Toca o telefone celular pessoal (atenção ao “pessoal”, ele significa intimidade do proprietário) e uma voz juvenil pergunta: “Roberto, você pode falar?” Respondo positivamente, visto que ainda não fui atingido pela afonia. “Roberto, eu sou estudante de jornalismo e preciso entregar um trabalho amanhã, quero uma entrevista com você”. Respondo que seria de bom alvitre marcarmos a conversa para outro dia porque naquele eu tenho compromissos acadêmicos e pessoais. “Você não quer fazer agora, está de má vontade”. A fala, autêntica, a ouvi várias vezes. “Afinal, é sua obrigação como professor me ajudar”. Já irritado pergunto a idade de quem fala comigo. “Por quê?”. “Porque com certeza ostento três vezes mais tempo de vida do que o senhor (ou senhora) e não tenho obrigação de ser tratado como ‘você’. E não sou tutor de preguiçosos que deveriam fazer seus trabalhos escolares em tempo certo”. Não raro, o telefone é batido, sem mais, pelo futuro habitante da redação.
Como resultado da cadeia, em mais de um ano no presídio Tiradentes, adquiri um defeito de identificação pessoal por motivos óbvios: recordar nomes na ditadura significaria entregar pessoas, não raro sem conhecimento, à tortura e à morte. Uma sequela que me prende ao passado é o oblívio e a confusão de nomes. Algumas vezes o problema gera efeitos caricatos. Certa feita, quando fazia uma palestra na Faculdade de Direito da USP, critiquei o dr. Fábio Konder Comparato. Com o silêncio atônito da audiência percebi que a pessoa não era a mencionada. O presidente do Centro Acadêmico atravessou a sala correndo e, ao pé do ouvido me contou o nome de quem eu visava: “Rodolfo Konder, professor, Rodolfo Konder”. A sala caiu na gargalhada. A causa: eu criticava o Konder que, após ser presidente da Anistia Internacional - com livro que trazia prefácio meu - assumiu cargo na prefeitura de Paulo Maluf. Algo que ia contra todo o seu currículo e não podia receber encômios. Casos como o citado são inúmeros. Mas se erro o nome de um jornalista, pago caro. No entanto, muitos da mídia me tratam de “Romão” ou quejandos... Certa feita, em entrevista à Rádio Eldorado o locutor me chamou o tempo todo de Roberto Macedo. Disse que gostava do colega mas não era o docente da USP.
Existem jornalistas que telefonam e não admitem adiamento das respostas. Mesmo que você esteja no banho ou efetivando tarefas delicadas, em aulas, palestras, reuniões. Deus mora na Redação santa, o resto deve servir e dar graças pela honra de ser ouvido. Alguns, mais grosseiros, diante de uma negativa temporária, dizem que ligarão depois. E nunca o fazem deixando a sua vítima na espera, após adiar compromissos etc. Outros querem impor respostas ao suposto entrevistado. Eles não buscam análises: almejam apenas um nome para cumprir os decretos da Santa Redação. Muitos pinçam frases em longa conversa e fornecem aos leitores o lugar comum mais pobre porque “de interesse jornalístico”. Com o tempo, vence o cansaço diante dos insensíveis no jornalismo. Começo a negar entrevistas, colaborações, etc. Este artigo é um desabafo. No Correio Popular tenho uma acolhida educada e gentil da redação. É muito, dados os mores jornalísticos de nossos dias
Mas logo notei que, se no meio jornalístico (como em todo outro) existem pessoas educadas e respeitosas, nele também grassam os que os gregos apelidavam de anaísthetos (casca grossa) desatentos aos problemas alheios, ocupados apenas em sua carreira e tarefas. A grosseria começa com estudantes de jornalismo. Toca o telefone celular pessoal (atenção ao “pessoal”, ele significa intimidade do proprietário) e uma voz juvenil pergunta: “Roberto, você pode falar?” Respondo positivamente, visto que ainda não fui atingido pela afonia. “Roberto, eu sou estudante de jornalismo e preciso entregar um trabalho amanhã, quero uma entrevista com você”. Respondo que seria de bom alvitre marcarmos a conversa para outro dia porque naquele eu tenho compromissos acadêmicos e pessoais. “Você não quer fazer agora, está de má vontade”. A fala, autêntica, a ouvi várias vezes. “Afinal, é sua obrigação como professor me ajudar”. Já irritado pergunto a idade de quem fala comigo. “Por quê?”. “Porque com certeza ostento três vezes mais tempo de vida do que o senhor (ou senhora) e não tenho obrigação de ser tratado como ‘você’. E não sou tutor de preguiçosos que deveriam fazer seus trabalhos escolares em tempo certo”. Não raro, o telefone é batido, sem mais, pelo futuro habitante da redação.
Como resultado da cadeia, em mais de um ano no presídio Tiradentes, adquiri um defeito de identificação pessoal por motivos óbvios: recordar nomes na ditadura significaria entregar pessoas, não raro sem conhecimento, à tortura e à morte. Uma sequela que me prende ao passado é o oblívio e a confusão de nomes. Algumas vezes o problema gera efeitos caricatos. Certa feita, quando fazia uma palestra na Faculdade de Direito da USP, critiquei o dr. Fábio Konder Comparato. Com o silêncio atônito da audiência percebi que a pessoa não era a mencionada. O presidente do Centro Acadêmico atravessou a sala correndo e, ao pé do ouvido me contou o nome de quem eu visava: “Rodolfo Konder, professor, Rodolfo Konder”. A sala caiu na gargalhada. A causa: eu criticava o Konder que, após ser presidente da Anistia Internacional - com livro que trazia prefácio meu - assumiu cargo na prefeitura de Paulo Maluf. Algo que ia contra todo o seu currículo e não podia receber encômios. Casos como o citado são inúmeros. Mas se erro o nome de um jornalista, pago caro. No entanto, muitos da mídia me tratam de “Romão” ou quejandos... Certa feita, em entrevista à Rádio Eldorado o locutor me chamou o tempo todo de Roberto Macedo. Disse que gostava do colega mas não era o docente da USP.
Existem jornalistas que telefonam e não admitem adiamento das respostas. Mesmo que você esteja no banho ou efetivando tarefas delicadas, em aulas, palestras, reuniões. Deus mora na Redação santa, o resto deve servir e dar graças pela honra de ser ouvido. Alguns, mais grosseiros, diante de uma negativa temporária, dizem que ligarão depois. E nunca o fazem deixando a sua vítima na espera, após adiar compromissos etc. Outros querem impor respostas ao suposto entrevistado. Eles não buscam análises: almejam apenas um nome para cumprir os decretos da Santa Redação. Muitos pinçam frases em longa conversa e fornecem aos leitores o lugar comum mais pobre porque “de interesse jornalístico”. Com o tempo, vence o cansaço diante dos insensíveis no jornalismo. Começo a negar entrevistas, colaborações, etc. Este artigo é um desabafo. No Correio Popular tenho uma acolhida educada e gentil da redação. É muito, dados os mores jornalísticos de nossos dias
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