TUCA PUC 1977
EU QUASE QUE NADA SEI. MAS DESCONFIO DE MUITA COISA. GUIMARÃES ROSA.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

camelôs....



Os camelôs, a ordem, as lutas da cidade por Bruno Cava, RJ Blog Quadrado dos loucos aqui


O movimento camelô expressa uma singularidade. Eles não se opõem ao trabalho assalariado dentro da hierarquia capitalista. Não são reativos: não se reuniram em um movimento contra o trabalho formal. Diferente disso, afirmam uma forma de vida singular que se projeta em comportamentos, desejos, relações afetivas, em um estilo próprio. Uma estética da produção. Na sua singularidade, o trabalho informal socializa a produção, no espaço comum das ruas, da linguagem coloquial, da economia popular. Ele se constitui em produção, e produção do comum.

Nunca antes na história do Rio de Janeiro se reprimiu tanto o trabalhador das ruas
. Três governos em consenso mobilizam todas as forças do estado em sucessivas operações de “choque de ordem”. Com espaço urbano disciplinado e funcionalizado, prossegue a supervalorização imobiliária, a imobilização do trabalho, o embranquecimento da população. Sob o slogan da “pacificação”, despejos sistemáticos e apreensões generalizadas empurram os pobres cada vez mais para a periferia, livrando as áreas mais próximas do mar aos ricos. Na esteira dos megaeventos da década, o Rio de Janeiro aos poucos vai tornando-se a cidade global sonhada pelas suas elites: uma grande Ipanema televisiva, branca, higienizada, nova-rica. Até uma Disney-Rio vem aí. Não admira a concentração de investimentos em áreas “pacificadas”, ou seja, a retroalimentação do acúmulo capitalista, sempre e sempre estruturada pelo estado.

Mais uma vez na história das lutas, é preciso contestar a concepção funcionalista de ruas, calçadas, praças, viadutos, estações de metrô e outros equipamentos urbanos. Como se houvesse uma “função natural”, inquestionável, para cada lugar, que caberia à prefeitura organizar, regular e fiscalizar. Esquece-se que a invenção da metrópole se dá num processo social. Menos que espaço neutro, trata-se de um lugar de conflito, intensamente político, com fundo histórico. Nesse sentido, o Rio de Janeiro, — foco intensificado de políticas de urbanização autoritária, — está servindo de tubo de ensaio para uma estratégia de disciplinamento das lutas e redução do cidadão a mero consumidor, — principalmente os contingentes da dita “classe C”. Pretende-se que as tecnologias de poder aplicadas, por exemplo, no “choque de ordem” e na ocupação do Alemão, sejam exportadas num futuro próximo para o país inteiro, como política unificada de segurança pública, urbanismo e desenvolvimento.

Afinal, se não para exercitar a democracia com ocupações, passeatas, intervenções e camelódromos, para que serviriam as ruas e praças? acaso, seria apenas para se locomover da casa ao trabalho? da casa ao shopping?!

As lutas do século 21 não se fazem só em redes virtuais, mas na ocupação, autovalorização e mobilização produtiva da cidade, — como aconteceu em Tahrir, Porta do Sol, Avenida Paulista. Na realidade, as redes criativas de relações remontam às primeiras metrópoles. Eficiência, utilidade ou mesmo beleza, bordões do discurso oficial (do estado e da imprensa), não passam de fetiches. Tais metas transcendem o processo de autoprodução dos cidadãos, geralmente para neutralizar e controlar as forças vivas da cidade, e então lucrar e acumular. No urbanismo, o “interesse público” muitas vezes esconde a tentativa de enquadrar a multiplicidade de vozes e desejos que circulam na cidade. Enquadrar na base do trator, do cassetete, do gás lacrimogêneo, da vigilância eletrônica. Esta a atuação da prefeitura municipal do Rio, cujo secretário de habitação, curiosamente, pertence a um partido de esquerda. Assim, a reorganização do espaço repercute o conflito social, numa dinâmica antagonista, com corte de classe e racial.

Ingrato capitalismo! se volta contra quem começou tudo: os camelôs, que montavam barraquinhas ao pé dos castelos medievais, situados nas rotas comerciais.

Fico com o altermundismo de Giuseppe Cocco, quando afirma que “o planejamento de tipo novo do qual precisamos é um modelo antropofágico, de inovação e criação: é o saque e a dádiva, a relação de alteração que faz o framing das favelas, na transformação das grandes pobres cidades em grandes cidades dos pobres: devir-cidade das favelas e devir-favela das cidades!” (“Governança das Metrópoles”, 2010: AnnaBlume, p. 74)

E fico também com o protesto de Vera Malaguti: “Estão ocupando a minha cidade. A linda, insubmissa e rebelde cidade do Rio de Janeiro. Para que fluam os grandes negócios transnacionais e esportivos. Para que as pessoas possam fruir sem serem incomodadas pela nossa pobreza. Essa é a minha triste impressão dos acontecimentos.” (http://www.correiocidadania.com.br/content/view/5287/9/)

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