por Cesar Benjamin, 3.4.10
Procuro um candidato
Nas economias contemporâneas, que operam com moedas fiduciárias, a emissão de moeda pelos bancos centrais precisa ser feita de forma coordenada com a emissão de títulos da dívida pública pelos tesouros nacionais. Com uma das mãos, o Estado põe moeda em circulação; com a outra, a retira. Um aspecto essencial da gestão macroeconômica é justamente encontrar, em cada momento, o equilíbrio entre as políticas monetária e fiscal. A virtual ausência dessa coordenação na Europa atual, em que o banco central é continental mas os Estados nacionais continuam a operar os seus próprios tesouros, está na raiz de uma prolongada estagnação e, recentemente, de crises que questionam a sobrevivência do euro. O Brasil funciona com uma coordenação precária e perversa. Nossa política monetária padece de uma deficiência estrutural. Por isso, tem de ser tensionada ao ponto de, no limite, retirar os graus de liberdade da política fiscal. Na raiz disso estão duas coisas: a existência de "moeda financeira" e a desregulamentação da entrada e saída de capital. O Banco Central é responsável por ambas as disfunções. Por causa delas, precisa operar sempre com uma overdose de juros. As variações na taxa básica de juros afetam a economia real ao provocarem movimentos inversos na oferta de dinheiro. Mas esse efeito é menor, entre nós, pelo fato de que a taxa básica incide sobre grande parte da dívida pública, a qual, por sua vez, negociada livremente no over, tem a mesma liquidez da moeda. Eis um nó que precisa ser desatado: operamos com um ente híbrido, que é meio de pagamento à vista, mas recebe juros reais. Recursos que têm a liquidez da moeda são remunerados como se fossem investimento ou poupança. Isso contraria os fundamentos de todas as escolas de pensamento econômico, sem distinção. A irracionalidade é óbvia.
Nesse contexto, cada alta do juro tem o efeito paradoxal de aumentar a quantidade de moeda financeira disponível e, com ela, o potencial de liquidez da economia. Logo, nunca há condições para que nossos juros se aproximem dos patamares internacionais; ao contrário, eles tendem sempre a voltar a subir.
Nosso BC autônomo arbitra soberanamente o custo de rolagem da dívida pública, remunerando rentistas, enquanto renovam-se na imprensa apelos à "responsabilidade fiscal". O dinheiro que gira no over, desassociado de qualquer iniciativa produtiva, recebe anualmente do Estado cerca de 8% do PIB, pagos com receita tributária ou com novos títulos que mantêm a roda girando.
Para alguns é o paraíso. Mas esse mesmo Estado não consegue investir 1% do PIB.
Sem coragem para contrariar a coligação rentista que nos governa, restou ao governo Lula brincar de PAC, inaugurando sofregamente promessas e miudezas, aliás com bastante êxito político numa sociedade que se habituou ao espetáculo.
O resultado está aí: nesta década, fomos o último colocado em crescimento na América do Sul. Nossa taxa média anual foi inferior à da África. Mas estamos felizes. Há circo e Bolsa Família para o povo, e os negócios (ancorados, em parte, na moeda financeira) vão bem.
Enquanto isso, o Estado permanece sem autonomia decisória na política macroeconômica: as "expectativas do mercado" determinam a taxa de câmbio, a política monetária e, por meio dela, os compromissos fiscais.
Procuro um candidato que sinalize uma mudança na macroeconomia brasileira, sem a qual não teremos projeto nacional.
Procuro um candidato
Nas economias contemporâneas, que operam com moedas fiduciárias, a emissão de moeda pelos bancos centrais precisa ser feita de forma coordenada com a emissão de títulos da dívida pública pelos tesouros nacionais. Com uma das mãos, o Estado põe moeda em circulação; com a outra, a retira. Um aspecto essencial da gestão macroeconômica é justamente encontrar, em cada momento, o equilíbrio entre as políticas monetária e fiscal. A virtual ausência dessa coordenação na Europa atual, em que o banco central é continental mas os Estados nacionais continuam a operar os seus próprios tesouros, está na raiz de uma prolongada estagnação e, recentemente, de crises que questionam a sobrevivência do euro. O Brasil funciona com uma coordenação precária e perversa. Nossa política monetária padece de uma deficiência estrutural. Por isso, tem de ser tensionada ao ponto de, no limite, retirar os graus de liberdade da política fiscal. Na raiz disso estão duas coisas: a existência de "moeda financeira" e a desregulamentação da entrada e saída de capital. O Banco Central é responsável por ambas as disfunções. Por causa delas, precisa operar sempre com uma overdose de juros. As variações na taxa básica de juros afetam a economia real ao provocarem movimentos inversos na oferta de dinheiro. Mas esse efeito é menor, entre nós, pelo fato de que a taxa básica incide sobre grande parte da dívida pública, a qual, por sua vez, negociada livremente no over, tem a mesma liquidez da moeda. Eis um nó que precisa ser desatado: operamos com um ente híbrido, que é meio de pagamento à vista, mas recebe juros reais. Recursos que têm a liquidez da moeda são remunerados como se fossem investimento ou poupança. Isso contraria os fundamentos de todas as escolas de pensamento econômico, sem distinção. A irracionalidade é óbvia.
Nesse contexto, cada alta do juro tem o efeito paradoxal de aumentar a quantidade de moeda financeira disponível e, com ela, o potencial de liquidez da economia. Logo, nunca há condições para que nossos juros se aproximem dos patamares internacionais; ao contrário, eles tendem sempre a voltar a subir.
Nosso BC autônomo arbitra soberanamente o custo de rolagem da dívida pública, remunerando rentistas, enquanto renovam-se na imprensa apelos à "responsabilidade fiscal". O dinheiro que gira no over, desassociado de qualquer iniciativa produtiva, recebe anualmente do Estado cerca de 8% do PIB, pagos com receita tributária ou com novos títulos que mantêm a roda girando.
Para alguns é o paraíso. Mas esse mesmo Estado não consegue investir 1% do PIB.
Sem coragem para contrariar a coligação rentista que nos governa, restou ao governo Lula brincar de PAC, inaugurando sofregamente promessas e miudezas, aliás com bastante êxito político numa sociedade que se habituou ao espetáculo.
O resultado está aí: nesta década, fomos o último colocado em crescimento na América do Sul. Nossa taxa média anual foi inferior à da África. Mas estamos felizes. Há circo e Bolsa Família para o povo, e os negócios (ancorados, em parte, na moeda financeira) vão bem.
Enquanto isso, o Estado permanece sem autonomia decisória na política macroeconômica: as "expectativas do mercado" determinam a taxa de câmbio, a política monetária e, por meio dela, os compromissos fiscais.
Procuro um candidato que sinalize uma mudança na macroeconomia brasileira, sem a qual não teremos projeto nacional.
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