TUCA PUC 1977
EU QUASE QUE NADA SEI. MAS DESCONFIO DE MUITA COISA. GUIMARÃES ROSA.

domingo, 27 de junho de 2010

Homofobia e assassinatos

Foto/arte: Kim Jon
Nota da ABGLT sobre o assassinato de Alexandre Ivo Rajão

Alexandre Ivo Rajão, 14 anos, foi assassinado na segunda-feira, 23/06, em São Gonçalo-RJ. Alexandre foi torturado com crueldade. O adolescente era ligado ao Grupo LGBT Atitude e voluntário da Parada LGBT de São Gonçalo. No laudo consta que ele foi morto por:

1- asfixia mecânica;

2- enforcado com sua própria camisa;

3- com graves lesões no crânio, provavelmente causadas por agressões com pedras, pedaços de madeira e ferro.

Alexandre voltava para casa às 2h30, quando foi brutalmente assassinado. Seu corpo foi deixado num terreno baldio.
O delegado Geraldo Assed, da 72ª DP (Mutuá), suspeita que o crime tenha sido praticado por skinheads e motivado por intolerância à orientação sexual. Três suspeitos foram detidos.

Este é um dos casos mais chocantes de violência homofóbica dos últimos tempos. A ABGLT conclama as autoridades competentes para que tomem todas as medidas cabíveis, que a justiça seja feita e os culpados punidos exemplarmente. Não podemos tolerar mais um caso de impunidade.

Segundo dados do Grupo Gay da Bahia, 198 lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais foram assassinados no Brasil apenas no ano de 2009, seguindo uma tendência anual crescente, e representando uma média de 1 assassinato a cada 2 dias. Sem dúvida, estes dados são subnotificados, uma vez que dependem de informações obtidas através do monitoramento dos meios de comunicação, e não existe o registro oficial (governamental) de estatísticas sobre a violência homofóbica.

A ABGLT reitera seu pedido, já formalizado duas vezes, de que o Ministério da Justiça implemente as políticas públicas previstas no Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos de LGBT, em especial as que dizem respeito à repressão da violência homofóbica.

A ABGLT pede que sejam feitos pronunciamentos sobre o caso na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, e que este seja um dos casos a serem expostos na Audiência Pública sobre Assassinatos de Homossexuais, a ser realizado no final deste ano pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, com requerimento já aprovado, proposto pela deputada Iriny Lopes e pelo deputado Iran Barbosa.

A ABGLT exige que seja aprovado o Projeto de Lei da Câmara nº 122/2006, que entre diversas formas de discriminação, proíbe e pune a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero.

Até quando parte do Congresso Nacional vai ser conivente com a prática da homofobia? Quantas pessoas LGBT ainda vão ter que sofrer discriminação e até ser mortas para que o Congresso Nacional cumpra seu papel de legislar para o bem de todos os segmentos da população?

Corroborando com a fala da dona Angélica, mãe de Alexandre Ivo, "... a gente tem que ser livre... , as pessoas têm que ter o direito de ir e vir, não interessa se você gosta de vermelho, eu gosto de laranja e ele gosta de branco", queremos uma sociedade que respeite a todos e todas, sem violência.

ABGLT - Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais

Fontes utilizadas: informações divulgadas na internet pelo Grupo LGBT Atitude São Gonçalo- RJ, por Marcelo Gerald, membro da comunidade Homofobia – Já Era, e por Madame Giselle, entre outras

Youtube: http://www.youtube.com/watch?v=JDcPsRTt1yQ&feature=player_embedded#


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Nota sobre a morte de Alexandre Ivo Rajão 1996 – 2010

Colaboração recebida de Marcelo Gerald, membro da comunidade Homofobia – Já Era


Esta semana, em meio à alegria da copa, nos deparamos com um dos crimes mais bárbaros de nossa história recente: a vida de Alexandre Ivo foi tirada aos 14 anos, aparentemente por motivo fútil, de ódio e homofobia, em São Gonçalo – RJ.

Segundo dados que chegaram via Orkut, Twitter, alguns blogs e poucos portais que noticiaram o ocorrido, Alexandre levava a vida como qualquer adolescente da idade dele. Era uma pessoa com alegria de viver, bom aluno e ligado ao Grupo Atitude, militante e ligado à organização da parada gay local, o que lhe confere uma consciência e maturidade que muitos adultos não tem.

De acordo com informações divulgadas por amigos e pela investigação, Alexandre teria apartado uma briga logo após o jogo do Brasil, contra a Costa do Marfim, na casa de uma amiga. Mais tarde, quando retornava para casa, os suspeitos o teriam abordado em um ponto de ônibus e em seguida o espancado e torturado por aproximadamente uma hora e meia, finalmente estrangulando-o. Seu corpo foi abandonado em um terreno baldio, local ligado ao tráfico, aparentemente pra disfarçar o real motivo do crime.

Ao ler sobre os detalhes deste crime e saber dos requintes da crueldade que Alexandre sofreu, fiquei em silêncio, sem ação alguma. Depois senti dor, tristeza, angústia e revolta tudo ao mesmo tempo. Que tipo de pessoas têm coragem de fazer isto com alguém (não tem como não pensar nisto)? O que eles ganharam com isto? Por que tanto ódio?

A vontade de fazer algo e ao mesmo tempo a sensação de impotência foi crescendo a cada fato novo que se somava. Ao mesmo tempo, vislumbro uma possibilidade de impunidade.

Impunidade sim, porque mesmo os suspeitos estando presos, não responderão criminalmente por homofobia, e certamente serão enquadrados por homicídio duplamente qualificado e motivo torpe. A homofobia que aparece como principal motivação pra este crime bárbaro não será punida.

Nossa Constituição diz expressamente em seu artigo quinto que somos todos iguais perante a lei, e que é garantido a todos o direito à vida, mas, graças à omissão de nossos legisladores, a mesma Constituição é desrespeitada. Aos homossexuais não é garantido nem mesmo o direito de serem quem são, de demonstrarem afetividade em público com garantias de que não serão agredidos por isso, ou de se casarem e verem crimes como este, que tirou a vida de um menino, sendo realmente punidos como deveriam.

Que igualdade é esta que confere aos homossexuais direitos limitados e não lhes reconhece as mesmas garantias estendidas ao restante da população?

Segundo dados do Grupo Gay da Bahia, a cada dois dias um homossexual é assassinado no Brasil. Mesmo assim, a aprovação do PLC 122, que é um projeto de lei complementar que criminaliza a discriminação por orientação sexual, caminha a passos de tartaruga, e na mesma semana da morte de Alexandre somos duplamente agredidos com a divulgação do projeto de lei do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), para “proteger os heterossexuais”, com conteúdo totalmente homofóbico, propondo a proteção dos “normais”!

Nós sabemos que a homossexualidade não é mais vista mais como doença há muito tempo pela psiquiatria e pela psicologia, então qual é o significado da alegada normalidade a que se refere este deputado?

Alguém já ouviu falar de assassinatos cuja motivação fosse a tal “heterofobia”? Isto não existe! Nunca tive conhecimento de algum caso de perda de emprego, expulsão de bares ou boates pelo fato de um indivíduo ser heterossexual, e se o deputado tivesse lido o PLC 122 (será que não o fez?) saberia que o projeto não cria privilégio a homossexuais e sim pune a discriminação por orientação sexual e sendo assim todos, gays ou héteros, estariam protegidos.

Outra coisa que chama a atenção neste crime é a repercussão do fato na imprensa, ou melhor, a falta dela!

Alexandre era jovem, bonito, estudante, engajado e foi vítima de um crime bárbaro, assim como Isabella Nardoni e João Hélio, mas, diferentemente destes, o caso não causou comoção nacional, mal foi destaque, e não teve cobertura da grande imprensa escrita ou televisiva. Em que difere Alexandre destas outras vítimas? Será que o fato de Alexandre ser supostamente gay, ter vários amigos gays, estar ligado à militância local o faz menos importante, menos digno de atenção, menos desejável como manchete?

A mesma imprensa quando noticia crimes cometidos por LGBTs dá grande destaque à orientação sexual ou à identidade de gênero. Aconteceu na semana passada, e diversos portais publicaram a manchete: “Travesti com HIV injeta sangue em enfermeira”... Casos como estes colocam nossa identidade ou orientação misturadas no cenário de um crime, mas quando somos vítimas da homofobia, a mesma imprensa fecha os olhos!

A tragédia desta semana me faz lembrar o caso de Matthew Shepard, que perdeu a vida aos 21 anos nos EUA por ser gay. Por lá, entretanto, a triste história causou comoção nacional, a mídia e a militância cobraram ação de autoridades, aprovação de leis e ainda contaram com ajuda do então presidente Bill Clinton, que cobrou pressa na aprovação de leis que protegessem os gays, cenário bem diferente da apatia governamental que vivemos aqui no Brasil.

Também chama atenção no desenrolar do caso a especulação em torno da sexualidade de Alexandre, gerada talvez pela dificuldade de parentes e da mãe em lidar com isto.

Eu entendo a Sra. Angélica pela relação que tenho com minha mãe, e talvez não fosse muito diferente comigo caso eu fosse vitimado por uma tragédia como esta. Tive receio em contar o que aconteceu com Alexandre pra minha mãe, pois ela tem verdadeiro pavor de que agressões que sofri no passado se repitam, ou algo ainda pior.

Graças a um ataque homofóbico eu tenho um problema no ombro desde os 17 anos de idade, e hoje tenho consciência de que terei que fazer uma cirurgia pra ficar livre disto. Isto porque fui atacado apenas porque desconfiaram que eu fosse gay! Eu mesmo não tinha a menor consciência de minha orientação na época!

A homofobia atinge a todos, e você não precisa ser gay, basta acharem que você é, assim como acontece com garotos emos héteros, muitas vezes vítimas da homofobia também. Lembro-me ainda de casos como Billy Elliot, que sofreu preconceito por ser bailarino, e, portanto, gay presumido. Penso também em Bobby Griffith, cuja homofobia da família “o suicidou”.

A sexualidade de Alexandre não muda mais nada agora! Ele poderia ser um hétero confundido por gay, poderia ser um gay se descobrindo, ou poderia nem ter consciência disto ainda. O único fato relevante é que, por todos os indícios, a homofobia matou Alexandre Ivo.

Os direitos e a aceitação a gays, lésbicas, bissexuais, trans, travestis e intersexuais evoluíram nos últimos anos, mas há quem diga que queremos privilégios, que queremos leis que nos dêem certo status “acima da população”, sendo que o que a militância busca é dignidade, respeito e IGUALDADE de direitos e obrigações, o que significa não termos que ver pastores pregando a intolerância em canais de TV, podermos andar na rua sem medo, não termos que nos trancar em guetos feitos ratos de esgoto! É vermos a igualdade que está na Constituição realmente se concretizar.

A morte de Alexandre nesta semana me fez reviver um questionamento antigo:

“Será que um dia viveremos em um mundo em que deixaremos de ser vistos como brancos, negros, índios, gays, heteros, deficientes, idosos, nordestinos? Será que um dia conseguiremos nos ver, ‘antes de mais nada’, como humanos?" Não deveríamos ser julgados pelo nosso caráter?
E...
“Tolerar a existência do outro e permitir que ele seja diferente ainda é muito pouco. Quando se tolera, apenas se concede, e essa não é uma relação de igualdade, mas de superioridade de um sobre o outro." (Saramago)

No Brasil, não podemos sonhar nem com as migalhas da tolerância, porque não nos foram garantidos direitos. Dez anos se passaram do assassinato de Édson Neris e pouco se avançou na criminalização de atos violentos motivados pela orientação sexual... Políticos prometem aqui e ali, mas pouco fazem de concreto, e a causa LGBT sai da agenda de quase todos após as eleições. Os avanços que tivemos nos últimos anos foram graças à Justiça e, ainda assim, de forma lenta.

Espero de verdade que os que cometeram este crime bárbaro sejam julgados e condenados...

Espero que a sociedade acompanhe tudo e não deixe Alexandre virar apenas mais um número em levantamentos estatísticos, e que gays tomem consciência de que o mundo não é colorido como apontado por uma revista de grande circulação...

Espero que não precisemos de mais centenas de crimes como este para termos o PLC 122 aprovado...

Espero que consigamos acabar com esta dura realidade que vivemos em nosso país, em que gays pagam impostos, mas são tidos como cidadãos de segunda classe, e onde a homofobia mata, mas não é crime!

A morte de Alexandre é dor imensurável para sua família e amigos, mas é também algo que atinge todos gays ou não que são constantemente vítimas da homofobia.

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