Renanos no senATO

Por Ricardo Noblat -
Quem será julgado

Vamos falar sério? Quem acompanha com o mínimo de atenção as trapalhadas da política brasileira espera que o Senado cumpra com o seu dever na próxima quarta-feira, dia reservado para o histórico julgamento de Renan Calheiros (PMDB-AL), acusado de quebra de decoro.
E qual é o dever do Senado? Simples, bastante simples: cassar o mandato de Renan. Apenas isso.
Sem essa de o Senado absolver Renan em troca da garantia de que ele renunciará à presidência e entrará logo de férias. Trata-se de manobra indecorosa urdida pelo governo. A consumar-se, produziria um retumbante escândalo capaz de enterrar de vez a reputação do Senado.
Renan e o governo escapariam sem maiores arranhões. O governo porque negaria de joelhos o patrocínio de tamanha sordidez. Renan porque carece de pele para ser lanhado. É uma chaga só. Se preservasse o mandato, sairia no lucro.

Cabe ao Senado condenar ou absolver Renan – e mais nada.

Nunca na história do Congresso a apuração de um crime foi conduzida de forma tão acintosa e arbitrária pelo próprio acusado.

Renan avalizou a escolha de Epitácio Cafeteira (PTB-MA) para relator do seu processo. Escalou a maioria dos membros do Conselho de Ética. Nomeou o substituto de Cafeteira depois que ele renunciou à função. Forçou a saída de Sibá Machado (PT-AC) da presidência do Conselho. Indicou o novo presidente. E por fim obrigou o Conselho a limitar-se ao exame dos documentos de defesa oferecidos por ele.

Queria mais o quê?
Fez o que poderia fazer, o que não deveria ter feito e o que parecia inimaginável que fizesse. E apesar de proceder assim, amargou derrota acachapante de 11 votos contra quatro quando o Conselho de Ética, montado à sua imagem e semelhança, concluiu que ele deveria ser cassado.

A essa altura, haverá algum senador que duvide da culpa de Renan? O que você acha, Aloizio Mercadante (PT-SP), tão caladinho? E você, Ideli Salvatti (PT-SC), que usa as palavras para esconder o que pensa?

Haverá - isso sim - senadores que estão pouco se lixando para os bons costumes. Que vêem em Renan seu próprio espelho.

Mentir à Nação é crime de quebra de decoro. Renan mentiu do início ao fim do processo.

Disse que tinha renda para pagar as despesas da jornalista Mônica Veloso, mãe de uma filha dele. A perícia da Polícia Federal demonstrou o contrário.
Insistiu que pagou as despesas de Mônica. A perícia não encontrou nexo entre datas de saques em contas dele e datas de depósitos em contas dela.

Renan negou que tivesse beneficiado a empreiteira do lobista responsável pelos pagamentos feitos a Mônica. Ele apresentou emenda ao Orçamento da União de 2005 destinando recursos para a uma obra tocada pela empreiteira no porto de Maceió.

Ao se deter sobre as contas de Renan, a perícia deparou-se com dois fatos espantosos.

O primeiro: verba indenizatória serve para ressarcir despesas mensais dos senadores diretamente ligadas ao exercício do mandato, tais como manutenção de escritórios e locomoção. Ela é paga contra apresentação de notas fiscais.

Pois bem: como meio de provar que sua renda era suficiente para bancar as despesas da ex-amante, Renan somou o que recebeu de salário com o que recebeu de verba indenizatória. Que tal?

Segundo fato espantoso: Renan engordou seus supostos rendimentos com um empréstimo contraído junto a uma empresa chamada Costa Dourada Veículos Ltda.

O tal empréstimo foi concedido em parcelas ao longo de dois anos. Não foi registrado em cartório. Não foi declarado à Receita Federal. E não foi pago.

Teve ano que a empresa não deu lucro e deixou de pagar dividendos aos seus donos. Mas Renan continuou sacando no cofre vazio da empresa. É razoável?

Pensando melhor: salve-se ou não, Renan está liquidado como estrela de primeira grandeza da política nacional.

A natureza histórica da próxima quarta-feira nada tem a ver com o julgamento pela primeira vez de quem ocupa o terceiro cargo na linha direta de sucessão do presidente da República. Na verdade, tem a ver com quem estará sentado no banco dos réus – o Senado.