Reinventar trajectórias
Publicado por Rui Bebiano em 17 de Maio de 2011 em HETERODOXIAS21 AQUI
Publicado por Rui Bebiano em 17 de Maio de 2011 em HETERODOXIAS21 AQUI
Para Marc Augé «o biciclismo é um humanismo». Escreveu-o no Éloge de la Byciclette (2008), cujo título desenha uma analogia óbvia com o título da famosa conferência proferida por Sartre em 1945 na qual, em debate com os marxistas – para quem o humanismo «esquece o homem concreto» –, o filósofo parisiense lançou as bases de uma certa «popularização» do existencialismo francês. O humanismo do qual falava nada tinha, porém, a ver com a noção, ultrapassada para ele, do valor do indivíduo como «fim em si mesmo» ou, muito menos, enquanto «valor superior». Em «O existencialismo é um humanismo», Sartre falava antes do homem como um ser «para o qual os valores existem» e do humanismo como uma atitude que, por este preciso motivo, lhe podia conceder alguma dignidade.
A posição de Augé une-se de algum modo a esta noção de um combate humano pela dignidade que lhe é própria. Fá-lo de uma forma muito pragmática, ao sentar o indivíduo sobre o selim da sua bicicleta pessoal, a partir dela inventando percursos de acordo apenas com a sua vontade, o ritmo do seu tempo, a energia e os caprichos que vai administrando. Descobrindo um mundo à sua medida enquanto pedala, por onde lhe apetece, parando quando quer, retomando depois o movimento numa qualquer direcção e a diferentes intensidades. Sem os constrangimentos do trajecto a pé mas também sem as limitações, determinadas pela rede de estradas e pelas regras do trânsito, que hoje experimenta o viajante motorizado, esse escravo dos mapas. Totalmente entregue apenas à sua própria escolha, «passando na rua, um domingo, às seis horas da manhã», como num poema de Jacques Réda.
A velha bicicleta é aqui apresentada como indício de futuro, ecológico e limpo, utilizado, a par dos transportes colectivos não poluentes, como meio de livre circulação pelas cidades que estão para vir. Fazendo redescobrir um certo «princípio da realidade» assente numa ligação estritamente pessoal entre o espaço e o tempo, liberto desse mundo invadido pelas imagens de destinos e de veículos no qual vivemos de uma forma bastante passiva. Sempre confinados às cadências do tráfego automóvel ou forçados a circular exclusivamente pelas vias impostas pela organização social do trabalho e pela gestão política dos espaços públicos. Um belo projecto, este de Augé, cuja configuração fantasiosa as actuais condições de restrição do desperdício – quando somos forçados a contabilizar as despesas até ao último cêntimo – tendem a transformar num projecto de vida tão necessário quanto desejável. Tendo como cenário um estado geral de reinvenção das trajectórias.
A posição de Augé une-se de algum modo a esta noção de um combate humano pela dignidade que lhe é própria. Fá-lo de uma forma muito pragmática, ao sentar o indivíduo sobre o selim da sua bicicleta pessoal, a partir dela inventando percursos de acordo apenas com a sua vontade, o ritmo do seu tempo, a energia e os caprichos que vai administrando. Descobrindo um mundo à sua medida enquanto pedala, por onde lhe apetece, parando quando quer, retomando depois o movimento numa qualquer direcção e a diferentes intensidades. Sem os constrangimentos do trajecto a pé mas também sem as limitações, determinadas pela rede de estradas e pelas regras do trânsito, que hoje experimenta o viajante motorizado, esse escravo dos mapas. Totalmente entregue apenas à sua própria escolha, «passando na rua, um domingo, às seis horas da manhã», como num poema de Jacques Réda.
A velha bicicleta é aqui apresentada como indício de futuro, ecológico e limpo, utilizado, a par dos transportes colectivos não poluentes, como meio de livre circulação pelas cidades que estão para vir. Fazendo redescobrir um certo «princípio da realidade» assente numa ligação estritamente pessoal entre o espaço e o tempo, liberto desse mundo invadido pelas imagens de destinos e de veículos no qual vivemos de uma forma bastante passiva. Sempre confinados às cadências do tráfego automóvel ou forçados a circular exclusivamente pelas vias impostas pela organização social do trabalho e pela gestão política dos espaços públicos. Um belo projecto, este de Augé, cuja configuração fantasiosa as actuais condições de restrição do desperdício – quando somos forçados a contabilizar as despesas até ao último cêntimo – tendem a transformar num projecto de vida tão necessário quanto desejável. Tendo como cenário um estado geral de reinvenção das trajectórias.
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